Casal Arnolfini (1434), de Jan van Eyck 👫
Um enigma pictórico na arte renascentista.
No coração da próspera Flandres, região da Bélgica, um artista se destacou com sua habilidade em criar detalhes minuciosos e realistas. Jan van Eyck é o mestre por trás do Retrato do Casal Arnolfini, uma obra do século XV que até hoje revela fascinação e mistério.
Mas por que esse quadro permanece um enigma pictórico para historiadores e críticos da arte? Confira a Arte da Semana da PIRA27 e venha descobrir!
O inventor da pintura a óleo? 🖌️
Por muito tempo foi atribuído a van Eyck os créditos pela invenção da pintura a óleo. Essa tese foi apresentada por escritores como o italiano Giorgio Vasari, autor do primeiro livro de história da arte.
Porém, estudos posteriores revelaram que a tinta já era empregada desde o século IX na China e no Afeganistão. Além da própria Europa desde a idade média.
Embora van Eyck estivesse longe de ser o primeiro a usar tinta a óleo, ele foi, sem dúvida, quem elevou essa técnica a um novo patamar. Seu aperfeiçoamento se deu com um método de aplicação em camadas finas e translúcidas, conhecidas como velaturas, que permitiam um controle meticuloso de luz e cor.
A qualidade do detalhe que van Eyck conseguiu trazer para suas pinturas ajudou a promover os benefícios da tinta para toda a comunidade artística. Anteriormente, os pintores usavam principalmente tinta têmpera.
Contudo, a têmpera seca rapidamente, o que impede o armazenamento e permite pintar apenas pequenas áreas por vez. O óleo, por outro lado, seca lentamente, permitindo o artista trabalhar horas em cima da obra e ter um melhor domínio da mistura de cores.
Mergulhando na obra 🏠
As camadas de tinta cuidadosamente construídas e o os detalhes trabalhados com pinceladas finas, proporcionaram ao Retrato do Casal Arnolfini uma sensação de objetos táteis e tridimensionais. O realismo buscado pode ser percebido na obra, pintada em uma tábua de madeira de 82.2 × 60cm.
A pintura é impressiona pela vasta quantidade de informações, que contribuem para a narrativa visual. O figurino, por exemplo, é um elemento de destaque no quadro.
A famosa vestimenta verde da figura feminina, acompanhada de uma touca de linho branco, destacam seu status social. Outros itens do ambiente, como o lustre, impressionantemente adornado e refletido em diferentes ângulos à luz da janela, confirmam a prosperidade dos Arnolfini.
Em cada detalhe da sala, percebe-se a habilidade quase fotográfica de van Eyck. A superfície de madeira do chão é cuidadosamente delineada, o manto escuro do homem possui borda de pele, um pedaço de tapete de tecido pode ser visto.
O tempo de secagem da tinta permitiu a mistura precisa de cores. Sua qualidade brilhante concebeu feixes de iluminação naturalista.
O espelho ao fundo é o ponto focal da composição. Na cena pintada em apenas 5,5 x 5,5cm, van Eyck revela a presença de mais pessoas na cena - uma delas seria o próprio artista - olhando a partir da mesma posição do espectador da pintura.
Um enigma pictórico 🤔
A obra é repleta de simbolismo e, como tal, tem sido objeto de distintas abordagens. O alemão Erwin Panofsky, um dos mais influentes historiadores da arte do século XX, propôs que a pintura era um documento de matrimônio, destacando elementos como as mãos dadas do casal e o cão, símbolo de fidelidade.
Panofsky viu a obra como um tipo de certidão de casamento visual, com van Eyck atuando como testemunha. No entanto, outros críticos desafiaram essa visão.
Alguns sugerem que a pintura poderia ser um memorial para a esposa de Arnolfini, que morreu em 1433, um ano antes da pintura ser concluída. Detalhes como a ausência de vela acesa do lado dela e o possível uso de roupas de luto pelo homem suportam essa teoria.
Além disso, o cão também pode ser visto como um acompanhante na morte, um tema comum em túmulos e efígies da época. Questões também cercam se a mulher na imagem está ou não grávida.
A explicação mais provável é bastante simples: um estômago arredondado era considerado belo na Flandres do século XV. Além disso, era comum o uso de mais de uma camada de roupa e vestidos avolumados, o que conferia uma silhueta ampliada às mulheres retratadas.
A inclusão de elementos religiosos, traz mais camadas para a obra. A Paixão de Cristo representada ao redor do espelho, adiciona piedade e devoção. A representação contempla não apenas a riqueza e o gosto de seus sujeitos, mas também seus princípios morais.
Certo é que o Retrato do Casal Arnolfini está repleto de detalhes que possuem significado literal e simbólico, outros comumente citados são:
🍊 Laranjas: por serem encomendadas de lugares distantes, as laranjas eram frutas caras que indicavam riqueza, mas também podem ser um sinal de pureza;
🕯️ Vela acesa: como um indício da presença onisciente de Deus e da fé cristã;
🛏️ Santa Margarida: padroeira das mulheres grávidas, estaria esculpida no topo do poste da cama;
🔴 Vermelho: presente no quarto, sobretudo na cama, como símbolo de fertilidade;
👞 Sapatos descalços: os sapatos fora dos pés do casal remetem a passagem bíblica tira as sandálias dos teus pés, porque o lugar em que estás é terra santa (Êxodo 3:5).
Fruto de intensos debates acadêmicos e populares, o rico quarto mobiliado dispõe de enigmas que dão muito pano para a manga. Como vimos, nosso artista explora todas as propriedades da tinta a óleo para evocar uma sensação de espaço realista, em uma composição rigidamente controlada.
Se você se envolveu com o estilo e os debates da pintura de van Eyck, não perca a oportunidade de continuar explorando as fascinantes histórias e referências que a PIRA27 traz para você. Inscreva-se e acompanhe nossas próximas edições!
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